sexta-feira, 30 de novembro de 2012

finda, novembro


amargo novembro de desvarios
desabo de sono
tenho andado pelas horas
com as mãos cheias de vício
em círculos
na procura fatigada do verso perdido
na desordem calada da minha cabeça

novembro de dias sem fim
comboio de tempos sobre tempos
sobre versos que não saem, sobre mim
tenho a boca suja de rancores
desferindo palavras
para dentro
no caminho estreito da garganta

tudo vacila, novembro, amargamente
é de traição a natureza das coisas
trai a sensatez
à míngua na minha cabeça
essas mãos viciadas, a boca muda
trai o atropelo demorado das horas
o aperto na garganta
covardemente, trai o sono
que me deita
a consciência.

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Memória de mãe


Morena, os passos ligeiros, o pulso firme. Minha mãe era silêncio. Trazia nos olhos uma marca indelével de ternura, logo soube: atrás deles morava uma menina magrelinha, pequenina, distraída com as mãos sempre sujas de tinta. Aprendi sua voz. Observei. No seu tempo, sem que ninguém lhe pedisse, floria. Cantarolava pela casa. Pintava bichinhos pelos panos. Abria as janelas. Num sopro de paz e solidão, também não tardei a descobrir: minha mãe mora em mim.