sábado, 7 de fevereiro de 2009

(Mo)cidade e fim

(dedicado ao fulgor de Castro Alves, meu eterno condor)

A cidade adormece ao meu contento,
Eu velo o seu sono da minha janela.
Da mansa donzela não dura o repouso
E logo amanhece em luz e ruídos,
Devora a inocência, meus olhos e ouvidos, estremeço.
Deflora o silêncio da casa, do corpo, ingrata, devassa, desnuda.
O centro da cidade pulsa, me entorpeço.
Em teus becos há tanto aroma,
Há o cheiro das gentes, das dores, dos tempos pairando nos ares.
A vida trasteja nos passos errantes de andares
Dos loucos, dos cães, das putas, das mães que vivem aqui.

Eu vivo e me entrego aos seus meneios.
Há um mundo à minha janela que me traga e transporta para mundos alheios.
Escala-me os seios, desvenda-me os mares, e faz-me acordar.
Amanheço e resido em todos os lares que cabem na fenda da minha parede.
Num lapso, a sede e o desejo me tocam em vida, fulgor, mocidade.
Eu sou o condor pelos ares despido a beber os perfumes da flor da idade.
Cidade-moça, transa de ruas e lares,
Renasço em você e gozo a verdade contida em seu chão,
Fazendo ecoar pelos céus o meu grito.
Meu corpo repousa no manto dos mares,
Desfeito em espumas no seu infinito.